Era o horário do rush. As ruas
estavam engarrafadas e as calçadas também. Era nessa hora em que a expressão
“formigueiro humano” fazia mais sentido. Centenas de seres, andando apressados,
com um destino certo em mente, só reparando em seus semelhantes quando esbarram
entre si. E mesmo assim voltam ao seu trajeto original o mais rápido possível.
E ele, apenas mais um. Não havia
o que o diferenciasse da massa. Roupa, cabelos, rosto, olhos. Traço algum
sobressaia em meio ao caos que havia diariamente ali. Passava despercebido por
todos, preocupados que estavam com os próprios pequenos problemas.
E também não percebia ninguém ao
passar. Tinha seu destino e seus pequenos problemas. Ignorava o resto. Seus
sentidos funcionavam apenas para evitar ser atropelado, tanto por carros quanto
por seres como ele. Estavam amortecidos pelo barulho constante, pelo
bombardeamento diário de informações, pelo desinteresse.
Mas algum nível de atenção ainda
tinha, pois percebeu algo que ninguém mais havia percebido ao passar por ali.
Uma mancha. Mas era mais que uma mancha. Ou melhor, menos. Era nada. Não
existia na calçada e não tinha tamanho algum.
Todos que passavam por ali
passavam à margem da inexistência. Mas sequer percebiam. Não haviam desviado, o
espaço que se distorceu para não levá-los ao abismo. E eles seguiam adiante, e
o mundo permanecia lógico e compreensível. Pois o vazio não os afetava.
Ele tentou passar à margem também,
mas ao contrario do que acontecia com o resto, o espaço se distorcia para
levá-lo de encontro ao que não existia. Mesmo andando na direção contrária, ele
ficava mais perto. Só parado que ele não se aproximava. O medo o fez ficar
parado. Ele não sabia o que era aquilo. E o desconhecido era atemorizante.
Mas o medo também acordou seus
sentidos a muito adormecidos. E ele reparou nas pessoas ao redor. O mesmo
efeito que fazia com que elas não se dirigissem a nada fazia com que elas não
esbarrassem nele. Ou o ouvissem. Ou o enxergassem. Ele havia desaparecido da
face da Terra se alguém se dignasse a procurar.
E o tempo continuou a passar. O
rush passou. A rua ficou vazia. E ele ainda parado. O medo ficava cada vez
menos forte em meio a outras sensações que começavam a tomar conta: sede, fome,
sono... E, conforme o medo diminuía, dava mais espaço a curiosidade. A vontade
de conhecer o desconhecido.
Lentamente se aproximou. Não era
difícil, já que o vazio parecia puxá-lo. Cada vez mais perto, cada vez mais
medo. Lentamente ele se aproximava. Até que chegou a distancia de um braço. Se
ele se esticasse já conseguiria alcançar o nada. Ele ficou completamente
parado. O medo se equilibrou com a curiosidade.
De perto ele pode observar melhor
o vazio. Era um ponto, infinitamente grande, mas ainda sim um simples ponto.
Nele continha tudo o que não existia. Não o que era imaginário, que existia na
imaginação, mas sim o que realmente não existia. O desconhecido se tornou
conhecido.
Era o horário do rush. As ruas
estavam engarrafadas e as calçadas também. Era nessa hora em que a expressão
“formigueiro humano” fazia mais sentido. Centenas de seres, andando apressados,
com um destino certo em mente, só reparando os outros quando esbarram entre si.
E mesmo assim voltam ao seu trajeto original o mais rápido possível.
Ele continuou seu caminho. Ele
olhava para os lados enquanto andava, observando a diversidade quase infinita
de pessoas na cidade. Ouvindo o rugido rouco dos motores e o grito histérico
das buzinas. Sentindo o cheiro quente de fumaça e fuligem.
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