Tudo começou com um pequeno incômodo intermitente no lado direito da cabeça. Um pequeno ponto de pressão. Algo natural e que só havia a espera para resolver. Ele continuou a trabalhar normalmente. Era mais um dia comum e chato na empresa em que a única coisa que realmente importava era a hora do almoço, a qual, para variar, não chegava.
O trabalho transcorria lentamente. Os dados não apresentavam nenhuma incongruência e ele ia organizando as tabelas da apresentação de amanhã. Quem iria apresentar os gráficos era o chefe, mas quem teria que montá-los era ele, que apenas sonhava com uma promoção que nunca chegaria.
O incômodo aumentava lentamente. Agora era contínuo e o ponto de pressão não era mais um ponto, e sim uma pequena área, localizada na parte posterior direita da cabeça, e que pulsava ao ritmo dos batimentos cardíacos. Ele começou a pensar em tomar alguma coisa, antes que o trabalho saísse prejudicado, mas teria que esperar até o intervalo já que não tinha nenhum remédio com ele.
Na hora do almoço, ele correu para a farmácia para comprar o seu remédio. Não era a primeira vez que tinha esse problema, então já sabia exatamente o que funcionava. Após a compra, foi comer tranqüilo. Dirigiu-se a um restaurante japonês que tinha ao lado do trabalho e pediu o de sempre, o combinado número dois, e um suco de laranja para tomar com o remédio.
O medicamento não ajudou em nada. A área de pressão, agora, atingia todo o lado direito da cabeça e cada pulsação era uma pontada de dor. Ela também afetava a parte de trás dos olhos, que os fazia arder e lacrimejar. A dor nunca tinha chegado nesse ponto depois de tomado o remédio e justo hoje ele não podia sair mais cedo. Tinha que fazer o trabalho, pois a apresentação seria amanhã.
Mesmo com a dor crescendo, lutou bravamente com os números. Apesar de o trabalho continuar fluindo, o humor dele foi todo tragado pela enxaqueca. Qualquer pessoa que ia falar com ele recebia como resposta um grunhido e uma ordem de não incomodar. Depois de algum tempo as pessoas pararam de atrapalhar e ele conseguiu acabar a apresentação.
A dor alcançou o ponto crítico. Todo o lado direito doía e pulsava como se tivesse uma marreta batendo repetidamente nele. Os olhos pareciam duas brasas com um prego perfurando-os por trás. A dor era tão grande que ele começou a ficar enjoado. Não havia a mínima condição de ele dirigir. Pediu à esposa que o buscasse.
Durante a viagem de carro, não falou uma palavra e cada vez que a esposa tentava falar, grunhia como um porco. Os barulhos do trânsito entravam pela cabeça dele e faziam lagrimas saírem por seus olhos. Ele ficou encolhido no banco do carro, querendo apenas que a dor parasse.
A luz agora passara a incomodar. O barulho passara a ser uma tortura. Ele sentia que ia vomitar a qualquer momento e a cabeça dele não mais existia, era apenas uma grande bola de dor e sofrimento. O tráfego estava ruim e ele pensava se não seria melhor morrer logo de uma vez ao invés de sentir aquela dor.
Quando chegou finalmente em casa, correu para o quarto. Fechou a janela e apagou a luz. Deitou na cama e ficou ali todo encolhido. Cada vez que ouvia um barulho mais forte que um alfinete caindo no chão, sua careta de dor piorava. E cada vez que sua querida esposa abria a porta para ver se estava bem, berrava de dor como um animal ferido.
Agora não havia mais pulsação e não importava mais se havia barulho ou luz. Não havia variação na intensidade da dor, ela era absoluta e tinha, há muito, passado do limite do insuportável. Então fez a única coisa que ainda não tinha tentado. Ele fugiu. Saiu correndo do quarto, tomou a rua e fugiu.
Quem o viu, apesar de sua forma e aparência, nunca diria que aquilo era um humano, tamanha a selvageria. Escondeu-se da luz e do barulho, mas não conseguiu se esconder da dor. E a dor o consumiu por completo.
Gostei do texto. Estranho fim.
ResponderExcluirtão intenso que pude sentir o sofrimento como se fosse meu!
ResponderExcluirparabéns!!
lembra-me um texto que eu escrevi!! vou postar no meu blog,vc já leu, mas é legal relembrá-lo, é desse estilo , intenso e com final imprevisível...
ResponderExcluirdepois vai lá dá uma olhadinha ;)
Impressiona a intensidade da dor e da descrição. "Li" minha enxaqueca em seu texto!
ResponderExcluirTambém me vi na dor da personagem. A descrição é minuciosa e dá conta de detalhar como a dor toma conta da pessoa.
ResponderExcluirReal demais para um final sem sentido.
ResponderExcluirGregório, fui até tomar um analgésico !!!...rsrs
ResponderExcluirObrigado pelos comentários. Dor de cabeça é um tema muito fácil para mim escrever porque desde criança eu tenho. Quanto ao final "irreal" o objetivo era dizer algo sobre a dor que eu não poderia, nem queria dizer diretamente.
ResponderExcluirNossa! Esse final foi forte!Final "irreal" ,em?!De certa forma ,vc disse tudo, meu caro. Realmente se não conduzimos a dor , ela nos consome. Como diz o adágio popular :"A dor é inevitável,mas o sofrer é opcional."valeu! Gostei!
ResponderExcluirObrigado pelo adágio, um dia eu ainda uso. XD
ResponderExcluirBem , compartilhar é tudo . Tudo de Bom ! Vc pode usar sim o q eu comento , se assim o quiser . Será uma boa trocar de conhecimentos e escritos. Valeu !
ResponderExcluirNunca passei por esse tipo de dor, mas já convivi com quem passava, e vi, no seu texto, uma descrição muito bem feita, que vai aumentando em densidade conforme a dor vai aumentando. Gostei muito do final, convida o leitor a participar do seu imaginário. Paulo
ResponderExcluirObrigado Paulo, você sabe, ou deveria saber, que o seu comentário é muito importante para mim.
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